15 de mar. de 2010

A comunicação tem no mínimo duas partes envolvidas

Esta reportagem de um Jornal de Sorocaba (SP) traz a visão de uma psicóloga sobre o que é de fato "se comunicar com as outras pessoas". Estabelece a necessidade de enxergarmos que na comunicação existem dois lados: quem fala e quem escuta.

Veja a íntegra e o link:

"Não é possível não se comunicar"


Marcia Z. Setton

Quando penso em comunicação, lembro que muitas pessoas dizem que se comunicam bem, porque falam bem, articulam bem as palavras, têm boa oratória, muitas vezes são expansivas e captam a atenção dos outros.



Mas, será que isto é uma comunicação verdadeira, ou melhor, autêntica? Será que para se comunicar não precisamos de interlocutores? Será que com qualquer interlocutor a comunicação é igual? Se dominássemos tão bem a ‘técnica‘ da comunicação, isto deveria acontecer com qualquer pessoa. Mas todos sabemos que não é assim. Podemos observar que com algumas pessoas a conversa flui fácil, tranquila, enquanto que com outras, não dá para conversar nem por um minuto, que logo sai uma discussão.



Se a comunicação fosse apenas uma produção racional dos seres humanos, como em geral acreditamos, isto não aconteceria. Mas, sob qualquer ação nossa, e considero a comunicação uma ação, podemos dizer que há uma emoção que a sustenta. Gosto muito de um autor, o biólogo Humberto Maturana, quando diz que: ao nos declararmos seres racionais vivemos uma cultura que desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento cotidiano entre razão e emoção, que constitui nosso viver humano, e não nos conta de que todo sistema racional tem um fundamento emocional. (2002)



Podemos observar que sob o efeito de alguma emoção aceitamos alguns argumentos que não aceitaríamos sob outras emoções. Por exemplo, coisas que foram ditas com raiva têm um poder e uma credibilidade diferente daquelas ditas na tranquilidade.



Muitas vezes, no seio da família, com as pessoas mais próximas, mais queridas, é que a comunicação fica mais difícil. É tão difícil entender o outro, ou ser entendido. Ter uma conversa produtiva e com bom termo.



Se por um lado, as expectativas não cumpridas, as mágoas (pequenas ou grandes), os assuntos não falados, os pequenos segredos, às vezes pequenas mentiras ‘inofensivas‘ se acumulam ao longo de toda uma vida familiar, por outro lado, as lealdades, as preferências, os vínculos afetivos, as afinidades também se avolumam. Desta forma vai sendo constituído um ‘caldo‘ de emoções confusas, às vezes contraditórias, que vão sustentar nossas comunicações familiares de modo recursivo, ou recorrente.



Voltando a Maturana, penso que ele nos oferece algumas ferramentas para abrir novas possibilidades para nossas interações através da linguagem. Para ele, a emoção fundadora do modo de vida do homem, em interações que permitissem uma convivência social é o amor. Mas, ele não está falando de um amor romântico. O amor é compreendido como a emoção que aceita o outro como um legítimo outro na convivência.



Pode parecer uma frase simples, ou até mesmo de efeito. Mas, se levarmos esta idéia para nossa família, escutaremos o outro como um legítimo outro, com seus desejos, quereres, necessidades, limitações, opiniões e afetos próprios e não necessariamente iguais ou parecidos com os nossos. Nem sempre nossos filhos são um prolongamento de nós mesmos.



Será que nós conseguimos?





Referência bibliográfica:



MATURANA, H. (2002) Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte, Editora UFMG.



WATZLAWICK, P., BEAVIN, J.H., JACKSON, D. (1993) Pragmática da Comunicação Humana. São Paulo, Editora Cultrix





Marcia Z. Setton é psicóloga, terapeuta familiar e professora do Sistemas Humanos Núcleo de Estudos e Práticas Sistêmicas de Sorocaba - mzsetton@gmail.com

http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=33&id=272647

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